Num primeiro olhar, parece mesmo haver um paradoxo entre o discurso e a prática eleitoral. Mas talvez o que esteja em jogo não seja incoerência, e sim uma lógica de decisão que opera em dois planos distintos: um ideal, de atributos desejáveis, e outro pragmático, marcado pela urgência e pela busca por resolutividade imediata.
A pesquisa bianual Ipsos Populism Report 2025 revela um cenário preocupante sobre a percepção social no Brasil: 69% dos brasileiros acreditam viver em uma sociedade deteriorada, enquanto 62% afirmam que o país está em declínio. Além disso, 76% enxergam a economia como um sistema manipulado para beneficiar os ricos e poderosos. Nesse contexto de desconfiança generalizada, 58% defendem a necessidade de um líder disposto a quebrar regras para promover mudanças, e 71% clamam por uma liderança forte, capaz de “tirar o país das mãos dos ricos e poderosos”.
Embora a pesquisa da Ipsos aborde a população brasileira como um todo, seus achados ecoam de forma contundente entre os eleitores da classe média gaúcha, que também expressam cansaço, desconfiança e o desejo por rupturas efetivas. Trata-se de uma população situada entre os extremos da renda, composta majoritariamente por trabalhadores e empreendedores, e que, em muitos estados, é a principal responsável pela movimentação da economia.
É plausível afirmar que será esse grupo social o grande definidor das próximas eleições no Brasil, justamente o mesmo que manifesta profunda descrença nas condições sociais e econômicas do país. Falamos de um grupo politicamente ativo, que debate temas sociais com intensidade, que tem filhos pertencentes à chamada Geração I, e que é formado majoritariamente por católicos e evangélicos. Trata-se de uma população que defende valores morais e sociais, muitas vezes acima das disputas político-partidárias, e que, acima de tudo, expressa um desejo genuíno de ver a sociedade dar certo.
Ao mesmo tempo, é justamente esse grupo social que se vê cindido entre os extremos políticos do país, não por afinidade ideológica, mas por uma lógica de exclusão e urgência, marcada pela escolha do “menos pior”. Trata-se de uma decisão pragmática, motivada por exceções, que frequentemente expulsa da disputa nomes ligados ao centro político, espaço ideológico que, não por acaso, representa os atributos mais valorizados na pesquisa Vozes da Classe Média.
Portanto, o processo de escolha do futuro governador exigirá, sim, qualidades como diálogo, competência técnica e sensibilidade social. No entanto, a razão idealizada tende a ser sobreposta pela urgência, muito bem captada pela pesquisa Ipsos. Essa urgência acelera o processo decisório e exige atenção estratégica.
O eleitor de classe média tem pressa, e essa pressa está ancorada em questões concretas que impactam diretamente seu futuro e seu modo de vida. Neste novo ciclo, não basta prometer. Será eleito quem convencer que sabe e pode resolver.