José Carlos Sauer é formado em Filosofia pela PUC-RS, pesquisador em comportamento político, consultor estratégico, analista de dados e diretor do Instituto Methodus. Com mais...Read more
Divulgamos recentemente uma série de avaliações dos Prefeitos da Região Metropolitana de Porto Alegre e, para sua realização, optamos por solicitar ao entrevistado um nota de 1 a 10 para o Prefeito de cada cidade contemplada no ranking. Naquela oportunidade, expliquei os motivos e as vantagens em avaliar o administrador através de uma nota, detalhado na análise sobre as justificativas para a nota obtida pelo Prefeito de Porto Alegre Sebastião Melo – MDB.
Aqui, no Instituto Methodus, seguimos investigando e procurando a cada dia compreender mais detalhes da nossa complexa Democracia. Nossa sociedade passou por profundas transformações nos últimos vinte e três anos, e hoje, encontramos mais perguntas do que respostas. Nossa Democracia aguardará na sala de espera até que consigamos compreendê-la melhor?
Neste sentido parece-me que a antecipação da razão, apresentada em resultados de pesquisas, será melhor compreendida se nos dedicarmos a conhecer a história por detrás dos resultados eleitorais das últimas eleições no Brasil.
As eleições municipais de 2020 se realizaram em um momento crítico de nossa nação. Em meio a pandemia do Coronavírus, fomos às urnas escolher os prefeitos que tomariam posse em janeiro de 2021, período delicado para a população brasileira que sofreria com o avanço das mortes e da contaminação pelo Covid, impondo restrições de circulação, medo e apreensão por todo o país. As circunstâncias inéditas daquele ano estabeleceriam o contexto para a eleição dos Prefeitos da pandemia. Haviam sido modificadas as condições para participação no processo democrático tradicional que conhecíamos até aquele momento. Observávamos por todo o país a presença do medo, da ansiedade, da insegurança, da incerteza, do sofrimento, do abandono e da perplexidade, um conjunto de sentimentos que transpassava a sociedade, influenciando diretamente as justificativas que o eleitor encontrava para escolher os candidatos naquela eleição.
Foram incontáveis os casos em que o eleitor optou pelo menor risco, elegendo aqueles que, naquele momento, atendiam as suas necessidades de sobrevivência. Para alguns isto significava o aprofundamento de ações restritivas à circulação/lockdown e a adesão à vacinação, e, para outros, significava a abertura imediata do comércio, a flexibilização das restrições de circulação e adesão ao tratamento precoce, como opções na tentativa de salvar a economia que estava cambaleante após meses de estagnação. Portanto, devemos nos afastar da ignorância e da hipocrisia e nos esforçar para compreender que as decisões de voto, realizadas naquele 2020, em grande parte foram binárias, ou a escolha entre o abre ou fecha.
Neste contexto não houve espaço para o crescimento de posições intermediárias, pois, mesmo que o eleitor considerasse as outras qualidades dos candidatos, era necessário firmar o compromisso de que, se eleitos, atenderiam a um ou outro lado. Foi assim por todo o Brasil e em cada cidade do nosso território é possível encontrar justificativas que nos permitem compreender por que este ou aquele candidato foi eleito.
Para compreender este evento histórico e utilizá-lo como chave interpretativa para as próximas eleições municipais, devemos retornar às eleições de 2020. Para isso, iremos conhecer o comportamento do eleitor em dez capitais brasileiras, quando foram eleitos os Prefeitos da pandemia.
Início chamando a atenção ao conceito de Desalento Eleitoral (acesse para conhecer o conceito), que é a soma dos eleitores que se abstiveram, votaram em branco ou nulo, e o que há de comum entre eles é o fato de não destinarem seu voto a nenhum candidato. Portanto, Desalento Eleitoral = (Voto branco + Voto nulo + Abstenção).
Nossas capitais chegaram ao ápice do Desalento Eleitoral em 2020, batendo todos os recordes, e as eleições daquele ano resultaram na menor participação de eleitores dos últimos vinte e três anos da história das eleições no Brasil.
Ao somar os eleitores das Capitais do Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba, Porto Alegre, Belo Horizonte, Salvador, Manaus, Recife, Fortaleza e Belém, chegamos ao total de vinte e cinco milhões (25.431.520) de eleitores. Destes, nove milhões e oitocentos mil (9.829.879) são desalentados, ou seja, não participaram do processo de escolha, chegando à casa de 39% do total de eleitores que estavam aptos a votar naquela eleição. Um percentual que, por si só, já é surpreendente, e quando analisado individualmente fica ainda mais preocupante. Observe a comparação do desalento eleitoral em cada capital:

Os prefeitos Eduardo Paes do Rio de Janeiro, Bruno Covas de São Paulo (in memoriam), Rafael Greca de Curitiba e Sebastião Melo de Porto Alegre, comparativamente, receberam um percentual inferior de votos nominais ao percentual de eleitores que votou em branco, nulo ou não compareceu – Desalento Eleitoral. Nestas quatro capitais os eleitores, que não participam da escolha dos candidatos, chegam à casa dos 48% dos votos que estão em disputa, reduzindo dramaticamente a quantidade de votos conquistados pelas candidaturas vencedoras.
Nas demais capitais que avaliamos, não é diferente. Apesar de individualmente estarem acima do percentual de eleitores desalentados, os prefeitos eleitos não conquistam uma votação expressiva, recebendo, numericamente, uma votação inferior à que foi obtida pelos eleitos na disputa de 2016.
Observo que para nossa democracia representativa, os resultados que analisamos não modificam as condições para consumação da vitória eleitoral. O que efetivamente nos interessa é chamar a atenção para o contingente de eleitores que, ou não compareceu a votação, ou votou em branco ou nulo. Este grupo de eleitores desalentados, quando somados aos que votaram na oposição aos eleitos, consolida uma maioria que não destinou o voto aos prefeitos avaliados.
Passado o período da pandemia e diante de uma eleição nacional que mobilizou o Brasil em 2022, os mesmos eleitores retornam à votação, chegando a índices de participação observados nas eleições municipais de 2008! Diante deste comportamento nos resta questionar; O eleitor desalentado, que alcançou índices recordes em 2020, retornara à votação na próxima eleição municipal em 2024? A participação dos eleitores na última eleição indica que sim! Diante desta inesperada mudança comportamental surge o desafio dos atuais Prefeitos no país, que exige conhecer o eleitor que não lhe concedeu o voto no pleito de 2020.
Neste sentido, para não se perder em meio a complexidade do tema e manter a atenção às referências que apresentei será necessário agir. Agir na mudança da realidade existente, abandonando o conceito, velho e ineficaz, da prática política por convencimento ou propostas ilusórias.
É necessário olhar além e esforçar-se para compreender que a individualização dos estilos de vida no mundo contemporâneo determinará a compreensão, o julgamento e a escolha do voto nas próximas eleições.
José Carlos Sauer é formado em Filosofia pela PUC-RS, Pesquisador em Comportamento Político no Laboratório de Política, Comportamento e Mídia da PUC-SP (Labô) e Diretor no Instituto Methodus. Nos últimos vinte e três anos, orientou políticos, governos e instituições nos Estados do Rio Grande do Sul, Acre, Roraima, Amazonas, Santa Catarina, Rio de Janeiro, Alagoas, Paraná e Goiás.
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José Carlos Sauer é formado em Filosofia pela PUC-RS, pesquisador em comportamento político, consultor estratégico, analista de dados e diretor do Instituto Methodus. Com mais de 25 anos de experiência no cenário eleitoral brasileiro, destaca-se na análise de tendências e no uso inteligente de dados para estratégias competitivas eficazes.