Na realização de análises e pesquisas, considero mais relevante compreender o comportamento do eleitor do que apenas observar sua escolha em simulações eleitorais. Investigar os valores ideológicos de um grupo amplia nossa capacidade de entendimento sobre a disputa e nos permite alcançar uma visão mais aprofundada e contextualizada dos temas em questão.
As análises de comportamento têm justamente esse propósito: revelar valores e crenças que, muitas vezes, passam despercebidos pela grande mídia, por exigirem maior tempo e atenção para serem interpretados.
A seguir, compartilho um conjunto de análises que exploram esses aspectos fundamentais e que nos auxiliam a compreender como os eleitores gaúchos estruturam suas visões de mundo e, por consequência, suas escolhas eleitorais.
Minha sugestão é que você também participe desse exercício, procurando avaliar com quais afirmações mais se identifica. Ao final, será possível reconhecer com maior clareza a sua própria posição diante dos diferentes valores em debate.
Na pesquisa Vozes da Classe Média, nossos entrevistados foram convidados a manifestar concordância ou discordância em relação a uma série de afirmações que, em sua formulação, carregam posições ideológicas implícitas. Diferentemente das perguntas tradicionais, que reduzem o eleitor a rótulos de esquerda ou direita, esse exercício busca revelar nuances mais profundas do pensamento político. A seguir, alguns exemplos:
- Deveria haver mais igualdade salarial entre as pessoas, mesmo que nem todas se esforcem da mesma forma.
A defesa da igualdade salarial concentra-se sobretudo entre os eleitores de Edegar Pretto (PT), que enxergam na redistribuição um pilar fundamental para reduzir desigualdades. Já os eleitores de Luciano Zucco (PL) tendem a relativizar ou rejeitar essa afirmação, aproximando-se do discurso meritocrático. Juliana Brizola (PDT) ocupa posição intermediária: seus eleitores não chegam a radicalizar no sentido redistributivo, mas também não negam a importância da igualdade.
- O ideal é pagar menos impostos e que cada um seja responsável por si mesmo, sem ajuda do Estado.
Aqui se acentua a diferença. A identificação com esse enunciado é mais intensa entre os eleitores de Zucco (PL), mas também encontra eco em segmentos que se aproximam de Gabriel Souza (MDB) e Covatti (PP). Entre os apoiadores de Pretto (PT), a rejeição a esse princípio liberal é consistente, o que reforça o contraste entre modelos de sociedade.
- O governo deve se esforçar para garantir o mínimo ao cidadão.
Essa afirmação encontra forte adesão nos eleitores de Pretto (PT), que esperam do Estado um papel ativo na proteção social. O mesmo não se observa entre os eleitores de Zucco (PL), cuja percepção caminha na direção de maior responsabilização do indivíduo.
- As pessoas devem se esforçar para garantir o mínimo por si próprias.
A adesão a essa ideia cresce entre os eleitores de Zucco (PL), refletindo a defesa de autonomia individual e menor intervenção estatal. Pretto (PT), novamente, aparece no polo oposto, reforçando a clivagem ideológica que organiza o cenário.
- Todo estrangeiro é bem-vindo no Brasil e Devemos avaliar bem quem pode entrar no Brasil.
Essas duas afirmações, quando cruzadas, revelam com clareza a disputa entre cosmopolitismo e nacionalismo. Pretto (PT) concentra eleitores que manifestam abertura à imigração. Zucco (PL), ao contrário, mobiliza eleitores que defendem restrição e maior controle das fronteiras. Brizola (PDT) tende a acompanhar mais de perto a posição progressista, mas sem a intensidade encontrada no campo petista.
- Na sua opinião, foi justa ou injusta a determinação para que o Ex-Presidente Jair Bolsonaro cumpra prisão domiciliar?
A polarização se traduz também nesse ponto: eleitores de Zucco (PL) majoritariamente consideram a decisão injusta, enquanto eleitores de Pretto (PT) a classificam como justa. Já os segmentos de Brizola (PDT) e Gabriel Souza (MDB) mostram maior divisão interna, sugerindo a presença de um eleitorado híbrido, menos cristalizado em torno de identidades ideológicas.
Ao analisarmos o conjunto dessas respostas, cruzando seus resultados com a intenção de voto, identificamos que a escolha do futuro governador no RS está menos associada a atributos pessoais dos candidatos e mais vinculada a visões estruturais de sociedade.
O eleitor de Pretto (PT) é guiado por valores de igualdade e pela defesa de um Estado ativo, enquanto o de Zucco (PL) expressa preferência clara pelo liberalismo econômico e pelo nacionalismo restritivo. Entre ambos, Brizola (PDT) e Gabriel Souza (MDB) representam possíveis espaços de mediação, que, neste momento, podem atrair segmentos menos cristalizados ideologicamente.
Como tenho observado, à medida que a disputa eleitoral se aproxima, os eleitores tendem a se deslocar para os polos mais definidos, esvaziando o centro e conduzindo o cenário para uma disputa cada vez localizada nos extremos. Esse movimento, já evidente em 2014, 2018 e 2022, tende a se repetir em 2026, colocando em xeque a capacidade de candidaturas de centro em romper a lógica binária da competição.
O resultado é um ambiente em que o eleitor gaúcho se vê pressionado a escolher não apenas entre nomes, mas entre modelos de sociedade em confronto aberto — um embate que extrapola a esfera estadual e se conecta à disputa nacional.
José Carlos Sauer – é graduado em Filosofia e mestrando em Filosofia Política pela PUC-RS. Com 25 anos de experiência em campanhas eleitorais no Brasil, é diretor do Instituto Methodus e consultor especializado em comportamento político. Atua com excelência na condução de pesquisas de opinião, interpretação de dados e desenvolvimento de análises estratégicas.
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Pesquisa Vozes da Classe Média – Metodologia
A pesquisa foi realizada com 600 entrevistas digitais, aplicadas por meio de plataformas acessadas via smartphones, tablets e computadores. O recrutamento dos respondentes ocorreu de forma orgânica e dirigida, durante a navegação cotidiana em ambientes digitais.
A amostra foi calibrada com base nas variáveis sexo, idade, escolaridade, renda e região, assegurando a representatividade do eleitorado gaúcho. A margem de erro é de ±4 pontos percentuais, com nível de confiança de 95%.
O público-alvo da pesquisa é composto por eleitores com ensino médio ou superior completos, mais de 35 anos e inserção ativa no mercado de trabalho. Esse grupo representa aproximadamente 40% do eleitorado do Rio Grande do Sul e é especialmente sensível às variações econômicas e à efetividade das políticas públicas, sobretudo nas áreas de segurança, emprego, educação e desenvolvimento regional.
A pesquisa utilizou a Methodus ID – Inteligência Digital, metodologia exclusiva do Instituto Methodus para coleta, calibração e análise de dados via plataformas digitais, com foco em representatividade eleitoral.