A um ano da eleição, a maioria dos eleitores gaúchos ainda não sabe em quem vai votar, mas já sabe em quem não pretende votar. Segundo os dados da pesquisa Methodus de setembro de 2025, 50,7% dos entrevistados rejeitam pelo menos um dos nomes testados para o governo estadual, enquanto 19% afirmam não rejeitar ninguém e 16,1% não souberam responder.
A rejeição cumpre, nesse contexto, uma função de autoproteção política: Antes de escolher, o eleitor já se defende, e a rejeição se torna o seu modo de permanecer politicamente lúcido.
A maneira como se rejeita, ou se evita rejeitar, revela vínculos distintos com a política. Metade do eleitorado adota uma postura frontal, marcada por juízo antecipado e necessidade de distinção. São, em geral, homens e integrantes da classe média, mais propensos a definir posição e reconhecer antagonismos. Para esse grupo, a recusa é uma forma de coerência identitária: rejeitar é se reconhecer, é marcar território.
O outro polo, mais silencioso e prudente, evita a negação explícita. Predomina entre mulheres e faixas de menor renda, grupos mais expostos à instabilidade e que, por isso, preferem manter a decisão em aberto.
Entre os que afirmam “não rejeito ninguém”, 30% ainda não sabem em quem votar, contra apenas 12% entre os que rejeitam alguém. A ausência de rejeição, portanto, não indica aceitação, mas suspensão de juízo, uma forma de esperar enquanto a política se reorganiza.
A rejeição também espelha o humor público com mais clareza do que a intenção de voto. Entre os eleitores que avaliam o governo estadual como “péssimo”, 62,2% rejeitam ao menos um candidato, enquanto entre os que consideram o governo “ótimo” essa taxa cai para 40%, e o grupo que “não rejeita ninguém” sobe para 32%.
O “não” cresce quando a confiança declina: é uma descarga afetiva que organiza a frustração. Onde há raiva, rejeita-se para reafirmar distância; onde há satisfação, a rejeição se dilui. O eleitor reage menos à figura dos candidatos do que à atmosfera emocional da política, a rejeição é, nesse sentido, uma tradução subjetiva da relação com o poder.
Também há uma estrutura social na forma de rejeitar. Ela é mais alta entre quem tem ensino superior incompleto ou renda acima de cinco salários-mínimos (em torno de 56%), e mais baixa entre os mais vulneráveis, 23% dos que ganham até um salário-mínimo afirmam não rejeitar ninguém.
A diferença sugere que a rejeição depende, em parte, de distância crítica. Nos estratos médios, mais informados e conectados, rejeitar é uma forma de moralizar o espaço político, filtrando o que não parece legítimo. Já entre as faixas populares, a recusa tende a ser pragmática: quem vive em incerteza prefere não fechar portas cedo demais. Trata-se menos de ideologia e mais de cautela.
Esses padrões revelam três modos de reagir à política.
O eleitor silencioso prudente evita o confronto e valoriza a previsibilidade, é o eleitor que precisa sentir segurança emocional antes de decidir.
O eleitor rejeitador identitário usa o “não” como sinal de pertencimento, enxerga a política como campo moral e rejeita por convicção, não por fadiga.
Já o eleitor afetivo reativo, se manifesta conforme o sentimento em relação ao governo vigente: apoia ou rejeita em função da emoção, movido por lealdade ou ressentimento.
Essas três reações coexistem e se entrelaçam, definindo um cenário de alta volatilidade afetiva e baixa estabilidade cognitiva.
A rejeição, nesse contexto, não deve ser lida como irracionalidade. Pelo contrário, ela expressa uma inteligência defensiva: o eleitor, desgastado por frustrações sucessivas, aprendeu a dizer “não” antes de se comprometer. A recusa precoce é um modo de preservar-se, um mecanismo de controle diante de um sistema que, reiteradamente, frustrou expectativas. O eleitor não rejeita porque é intolerante, mas porque já confiou demais. E, ao rejeitar, ele participa: transforma a desconfiança em gesto político, manifesta lucidez em meio ao desencanto.
O mapa da rejeição mostra, assim, um eleitorado que não se afastou da política, mas que se protege dela. O “não” se tornou o idioma da prudência num ambiente de promessas quebradas e identidades exauridas.
A tarefa dos próximos meses, para quem disputa o voto, não é apenas conquistar simpatia, mas reconstruir o direito de confiar e devolver ao eleitor a sensação de que dizer “sim” ainda vale a pena.
José Carlos Sauer – Diretor do Instituto Methodus, especialista em comportamento político e graduado em Filosofia Política. Há mais de 25 anos atende disputas eleitorais, conduzindo pesquisas de opinião, interpretação de dados e análises, além do direcionamento estratégico para campanhas.
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