Segundo definição dada pelo Tribunal Superior Eleitoral, Vereador é o elo “entre o governo e o povo. Ele tem o poder de ouvir o que os eleitores querem, propor e aprovar esses pedidos na câmara municipal e fiscalizar se o prefeito e os secretários estão colocando essas demandas em prática”. Aos eleitores, segundo a própria constituição federal, cabe a fiscalização do trabalho realizado pelos vereadores eleitos, podendo ir às sessões legislativas ou mesmo conversando com os Vereadores em seus gabinetes. Neste sentido, alocado pelo interesse demonstrado pelos eleitores ao votar em um político que represente seus interesses, ao Vereador cabe a ligação mais estreita entre um líder político e seus eleitores. Porém, esta ligação é realmente verídica e efetivada? E os eleitores, possuidores de direito à fiscalização destes líderes políticos, realmente se interessam por esse processo?
Neste artigo, analisaremos os dados obtidos na pesquisa realizada em Porto Alegre com exclusividade do Instituto Methodus no que tange ao interesse dos eleitores sobre a Vereança. Para isto, é necessário primeiramente buscar o histórico das últimas cinco eleições realizadas em Porto Alegre para o cargo de Vereador, para entendermos a evolução do desalento eleitoral e destinação de voto para, posteriormente, elucidarmos as reais motivações de escolha e interesse participativo dos eleitores no processo de Vereança.
- Desalento Eleitoral
Se você, caro leitor, acompanha com frequência as publicações realizadas pelo Instituto Methodus, deve estar familiarizado com o termo “Desalento Eleitoral”, mas para que todos se habituem, o Desalento Eleitoral representa o afastamento do eleitor do pleito, caracterizado pela soma das variáveis Abstenção, Voto Branco e Voto Nulo.
Quando o eleitor opta por não ir até sua zona eleitoral, estando sujeito a multa estipulada pelo Tribunal Eleitoral, ou quando vai até a zona eleitoral porém não destina seu voto à nenhum dos candidatos disponíveis, optando por anular ou votar em branco, este eleitor nos revela que existem sentimentos e subjetividades que o repelem da intenção de escolha de um representante político, ao qual, teoricamente, se encaixaria com as suas aspirações como indivíduo pertencente à sua sociedade ou comunidade. Tais sentimentos incluem a frustração, o ódio, o desinteresse, o medo e a desilusão, demonstrando que o eleitor desalentado se coloca as avessas ao processo eleitoral.
Abaixo apresentamos os dados históricos das últimas cinco eleições para o cargo de Vereador na cidade de Porto Alegre para podermos observar, graficamente, a evolução do fenômeno do Desalento eleitoral, comparado com outras variáveis:
Neste gráfico, encontramos três variáveis que precisam ser analisadas com atenção. São elas os Votos nominais, onde o eleitor destina seu voto a um candidato ou candidata apto; o Voto na legenda, onde o eleitor destina seu voto à sigla do partido ao qual se sente mais aproximado naquele pleito; e o Desalento eleitoral.
Note que, na eleição de 2004, o número de votos nominais teve um aumento de mais de 69 mil votos, em comparação com os dados da mesma variável no pleito anterior, 2000. Em contrapartida, o número de votos na legenda diminuiu mais de 45 mil votos. Ou seja, neste período, os eleitores encontraram, em maior número, candidatos e candidatas que se aproximaram dos seus valores, e destinaram seu voto á estes representantes. Já no pleito de 2008, observamos o inverso do que ocorreu em 2004. Neste pleito, o número de votos na legenda aumentou consideravelmente (mais de 53 mil votos), enquanto os votos nominais mostraram um declínio astronômico (com uma queda de mais de 92 mil votos). Neste cenário, estes eleitores encontraram no partido alinhamento e valores suficientes para destinar o seu voto, independente do líder político que ocupou a cadeira de vereança naquele ano.
O que observamos na eleição de 2012 é a queda do voto na legenda, retornando bem próximo aos números apresentados em 2004, e o aumento do voto nominal, porém com uma ressalva: O retrocesso da escolha da legenda pelo eleitor não foi condicionante para a destinação do seu voto à um candidato ou candidata. Houve um aumento do voto nominal, porém com uma grande diferença dos dados encontrados, desta mesma variável, no pleito de 2004.
Nas eleições posteriores, 2016 e 2020, observamos uma queda constante dos votos nominais, com o mesmo fenômeno acontecendo nos votos da legenda. Ou seja, os eleitores não encontraram representantes, tanto na figura do candidato, quanto na figura do partido, para seus anseios. Mas a quem esses eleitores destinaram sua escolha?
A variável que seguiu uma curva contínua de evolução foi o desalento eleitoral. Note que, a cada pleito, o número de eleitores desalentados seguiu aumentando, passando de 184.269 para expressivos 446.958. Em comparação com a última eleição para prefeito em Porto Alegre, que também apresentou um número expressivo de eleitores desalentados, 404.431, o desalento eleitoral para o cargo de Vereador supera o desalento eleitoral para o cargo de Prefeito. Nesta mesma eleição, 2020, o atual prefeito de Porto Alegre foi eleito por um número de votos inferior ao número de eleitores desalentados. Logo, o maior número de eleitores deste pleito optou pela escolha do Prefeito Invisível ao invés do candidato e da candidata que estavam disputando o segundo turno.
No cargo de Vereador, o fenômeno do Prefeito Invisível segue o mesmo padrão. A vereadora eleita com maior número de votos obteve 15.702 votos nominais. E o somatório de votos em candidatos e candidatas tem se aproximado cada vez mais do número dos eleitores desalentados. Portanto, a relação e definição de um vereador com seu eleitor, apresentada no início deste artigo, tem se mostrado cada vez mais tênue. O eleitor, quando não retorna ao processo de escolha de um candidato que represente os seus valores morais e cívicos, ou que não enxerga na sigla de um partido alinhamento suficiente aos seus anseios, se afasta definitivamente do processo democrático, escolhendo o Vereador Invisível como o seu líder político. Esse afastamento tem inúmeros fatores, conforme apresentado na conceituação do desalento, que representam os sentimentos dos eleitores ao processo eleitoral de fato. Mas como, e por que este fenômeno está acontecendo?
Acompanhe a próxima publicação, onde observaremos o que nos diz o comportamento dos eleitores porto alegrenses e conheceremos as motivações de voto desses eleitores e seu engajamento com a vereança.
Schaiany Stallivieri é Socióloga, Pós-graduanda em Ciência Política, pesquisadora em Comportamento Político e Analista de Pesquisas do Instituto Methodus.