Com o início do ano eleitoral, ressurgem no mercado as polêmicas em torno dos resultados das pesquisas eleitorais divulgadas nesse período. A cada nova divulgação, o ambiente político se agita, pois sempre há aqueles que discordam dos resultados apresentados e geralmente, quem não aparece em primeiro lugar nas simulações tende a desacreditar a divulgação. O que nos leva a outro problema: a enorme falta de compreensão sobre como uma pesquisa deve ser conhecida e compreendida por eleitores e políticos.
Neste artigo, esclarecerei alguns pontos que podem contribuir para a compreensão sobre o registro de pesquisa e como identificar suas principais características.
No dia 20 de junho, foi divulgada a pesquisa ATLAS/CNN com resultados sobre a disputa eleitoral em Porto Alegre. Logo após sua divulgação, recebi várias ligações com questionamentos sobre os resultados e a metodologia utilizada. Portanto, farei a análise a partir deste caso, onde, mais uma vez, dúvidas, críticas e questionamentos foram debatidos no meio político.
O primeiro aspecto que causou controvérsia foi a metodologia de coleta utilizada pela empresa, que reuniu seus dados através de divulgações nas redes sociais. Esta informação não consta na divulgação dos resultados, pois a CNN anuncia que “a pesquisa ouviu eleitores porto-alegrenses“. Portanto, é necessário compreender o que foi proposto para a realização deste estudo.
Para isso, devemos acessar o sistema de registros de pesquisas eleitorais do T.S.E. Vou deixar aqui o link para consulta. Acessando o site, obteremos todas as informações exigidas pela legislação eleitoral. Se você for ingressar no sistema, identifique o estado e município que pretende consultar; aparecerá para você a lista de pesquisas registradas, que foram, ou serão realizadas em sua região.
Quanto à metodologia de pesquisa, o instituto declarou que realizou uma pesquisa quantitativa com coleta aleatória via questionário estruturado web e pós estratificação da amostra de acordo com as características do eleitorado de Porto Alegre – RS.
Não há nada de errado em realizar pesquisas através de questionário estruturado web com pós-estratificação da amostra; esta é uma técnica válida, pois permite que o eleitor acesse o questionário para responder no meio digital. Inclusive a utilizamos aqui no Instituto Methodus.
Outro ponto questionado foi quanto ao impulsionamento do link da pesquisa nas redes sociais. Esse é o meio que as empresas oferecem para que seu conteúdo chegue aos usuários, e, novamente, não há nada de incorreto em impulsionar links para a divulgação da pesquisa, especialmente se o objetivo é acessar o eleitor através das mídias digitais.
Quando chegamos ao plano amostral e ponderação quanto a sexo, idade, grau de instrução e nível econômico do entrevistado, intervalo de confiança e margem de erro, devemos procurar compreender o que foi proposto para a realização do estudo. Nesta etapa do registro são delimitadas as variáveis de controle da pesquisa, que a diferenciam de uma enquete, onde não existem variáveis de controle. Normalmente, é aqui que as coisas se complicam, pois a delimitação das variáveis é uma escolha realizada previamente pelo instituto e que pretende representar a população da cidade onde a pesquisa é realizada. Para isso, o responsável declara que fez uma amostra aleatória pós-estratificada via algoritmo iterativo utilizando cotas amostrais proporcionais representativas, em função das características do eleitorado de Porto Alegre. Ao declarar que as cotas são proporcionais e representativas, espera-se encontrar semelhança entre o que é declarado pelas fontes dos dados consultadas e os resultados obtidos na pesquisa. No caso da pesquisa em análise, as fontes de dados utilizadas foram PNADC 2021-2024 para as cotas de escolaridade e nível econômico, e T.S.E. 2024 para as cotas de sexo e faixa etária.
Ao comparar as escolaridades declaradas no registro com as fornecidas pelo T.S.E. para eleitores de Porto Alegre, podemos encontrar diferenças entre as duas fontes de dados.
Abaixo tabela comparativa:
Essa simples comparação nos permite observar que a pesquisa ouviu eleitores com escolaridades diferentes daquelas indicadas pelo T.S.E. como representativas do eleitorado da capital. Tal diferença não invalida o resultado da pesquisa, pois o próprio instituto indica que utiliza a PNADC 2021-2024 como fonte para determinar as escolaridades e não o T.S.E.
Neste sentido, a legislação eleitoral deixa brechas para diversas interpretações.
Afinal, qual seria a fonte de dados correta? PNADC 2021-2024 ou Tribunal Superior Eleitoral? Ao regular o registro de pesquisas, o legislador não determina quais fontes de dados devem ser utilizadas, apenas exige que seja informada aquela que foi utilizada. Em casos como o que estamos analisando, fica evidente a discrepância entre duas fontes distintas, e são essas diferenças que geram dúvidas no mercado político. Como resultado, em disputas eleitorais, veremos a judicialização e consequente pedido de impugnação das pesquisas divulgadas, gerando insegurança a quem utilizam estas informações.
Apesar de não nos caber discutir a legislação, é necessário encontrar formas de explicar ao leitor como interpretar essas incoerências sem penalizar os resultados divulgados.
Para finalizar, destaco que a pesquisa que analisamos tem validade técnica, porém não é representativa de todos os eleitores da capital, como vem sendo divulgado, mas sim dos eleitores usuários das redes sociais onde foi respondida.
As polêmicas em torno das pesquisas eleitorais ressaltam a necessidade de uma maior educação política entre eleitores e candidatos. A falta de compreensão sobre a metodologia e a interpretação dos dados pode gerar desconfiança e minar a credibilidade dos processos democráticos. É crucial que tanto os políticos quanto o público entendam que as pesquisas são ferramentas estatísticas sujeitas a margens de erro e variações. Ao promovermos a transparência na divulgação das metodologias, fomentamos a alfabetização estatística, que nos ajuda a reduzir as controvérsias fortalecendo a confiança nas pesquisas que o Instituto Methodus conduz no Brasil.
José Carlos Sauer é formado em Filosofia pela PUC-RS, Pesquisador em Comportamento Político no Laboratório de Política, Comportamento e Mídia – Labô, Consultor e Diretor no Instituto Methodus. Nos últimos vinte e cinco anos, orientou campanhas eleitorais, políticos, governos e instituições nos Estados do Rio Grande do Sul, Acre, Roraima, Amazonas, Tocantins, Santa Catarina, Rio de Janeiro, Alagoas, Paraná e Goiás.